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Segurança Multidimensional – Uma reflexão

 O tráfico ilícito de pessoas é assunto de novela na televisão ou parte da realidade pouco percebida? A pobreza extrema e a exclusão social compõem apenas aspectos do desenvolvimento sócio econômico ou afetam a segurança ? Os ataques cibernéticos são ilícitos de hackers ou fazem parte de uma guerra virtual? Com estes questionamentos – antigos e atuais ao mesmo tempo – iniciamos uma breve reflexão sobre um a ampla gama de aspectos de segurança.

 A Declaração sobre Segurança nas Américas ampliou a concepção de segurança, no âmbito do Hemisfério, para um alcance multidimensional, incluindo, além das ameaças tradicionais, um rol de nova s ameaças, preocupações e desafios.

 As novas ameaças especificadas na Declaração são os desastres naturais; o tráfico ilícito de pessoas; o possível uso de armas de destruição em massa por terroristas; os ataques cibernéticos; os danos decorrentes de um acidente ou incidente no transporte marítimo com materiais perigosos; a pobreza extrema e a exclusão social; o terrorismo; o crime organizado transnacional; a lavagem de ativos; o tráfico ilícito de armas e as conexões entre eles; a corrupção e o problema mundial das drogas.

 A Declaração incorpora as prioridades de cada Estado, contribui para a consolidação da paz, para o desenvolvimento integrado e para a justiça social; se baseia em valores democráticos, na promoção e defesa dos direitos humanos, na solidariedade, na cooperação e no respeito à soberania nacional.

 Assim sendo, a segurança multidimensional é um a concepção válida e útil para a segurança no âmbito do continente americano. Cabe ressaltar que as chamadas novas ameaças tem graduações e peculiaridades muitos distintas conforme a região ou país das Américas. No caso de desastres naturais, por exemplo , as áreas com ocorrência de abalos sísmicos estão mais sujeitas aos efeitos de terremotos do que outras regiões.

 Assim, as novas ameaças têm matizes diferentes em cada região e variam segundo a intensidade, conforme são afetadas por cada ameaça. Ou seja, a segurança multidimensional é considerada de acordo com o nível de comprometimento frente à ameaça configurada em cada país.

 Da mesma forma, como o nível da ameaça está ligada a determinada área, deve ser considerada a evolução no tempo desse rol de preocupações e desafios. Ou seja, existem ameaças mais permanentes, que perduram no tempo, e outras, mais emergentes. A questão do terrorismo, por exemplo, ficou muito mais evidente após o atentado de 11 de setembro de 2001, se revelando uma ameaça muito mais contundente para os Estados Unidos, se compara da a outras partes das Américas. Dessa forma, caracterizando que a concepção de segurança multidimensional incorpora as prioridades de cada Estado.

 Por sua vez, o conceito de segurança multidimensional tem validade no sentido de que certas regiões que são afetadas por determinada ameaça podem receber ajuda de outras, evidenciando a cooperação entre os Estados do continente Americano. Como, por exemplo, a situação do forte terremoto que sofreu o Haiti em janeiro de 2010, onde vários países imediatamente se mobilizaram para enviarem ajuda humanitária para aquele país, demonstrando notória solidariedade.

 Por outro lado, questões sócio econômicas, como a pobreza e exclusão social, são de extrema complexidade e exigem intrincadas soluções, passando pelo desenvolvimento econômico, que extrapolam, às vezes, questões de segurança.

 Então, é importante considerar os níveis de desenvolvimento no continente e suas assimetrias, pois há países desenvolvidos, emergentes e outros em situação sócio – econômica mais delicada. Entre um extremo e outro podemos citar a assimetria que existe entre os Estados Unidos e o Haiti.

 Nesse sentido, corrobora a cientista política Daniela Vieira ao escrever artigo sobre a crise na Bolívia que “os séculos XX e XXI são testemunhas de que as ameaças no continente latino – americano passaram a decorrer mais diretamente de suas crises de fundo sócio econômico.” E arremata ao afirmar que não se deve “ignorar a história da região e a necessidade de englobar em primeira instância problemas de segurança segundo um enfoque multidimensional que supere demandas meramente de defesa e que proponha soluções urgentes à problemática econômica e social.

 ” Ou seja, essas questões sócio econômicas impulsionam a necessária e importante cooperação hemisférica, contribuindo para o desenvolvimento integrado. Conforme Daniela Vieira“ algumas questões e desafios, particularmente na América Latina, superam questões tradicionais de defesa e repousam sobre problemas de fundo conjuntural. ”E comenta Alberto Silva que “as formas clássicas de resolução dos conflitos pela via armamentista e intimidação bélica já não respondem aos desafios e impasses contemporâneos.”Portanto, é válido afirmar que a segurança multidimensional pode contribuir para a consolidação da paz.

 Nesse contexto, Alberto Silva agrega que “a segurança militar continua relevante decisiva, mas não é a única a ser garantida.”As novas ameaças aglutinam um misto de problemas antigos – conjunturais, com outros desafios mais recentes. São questões que se avolumaram e ganharam transparência com a globalização da informação. Dessa forma, verifica – se que o alcance multidimensional responde às novas ameaças – algumas mais proeminentes na atualidade.

 Vejamos o caso do Brasil, país emergente, cuja crescente consolidação da democracia permitiu enfrentar com mais eficiência as novas ameaças. A Constituição Brasileira de 1988 já previa dispositivos que garantiam condições para que as Forças Armadas se constituíssem no último recurso frente a maiores ameaças. Posteriormente, dispositivos complementares definiram as responsabilidades detalhadamente. Assim, o aparato jurídico para o emprego de meios militares delimitou as responsabilidades para cada órgão em um ambiente democrático, contribuindo para a estabilidade e a paz.

 No âmbito do poder executivo brasileiro o Gabinete de Segurança Institucional (GSI), órgão da Presidência da República, é “encarregado da manutenção da estabilidade institucional, da administração de crises e a assessoria presidencial em todas as questões militares e de segurança. ”Efetivamente o Gabinete cumpre um papel proeminente frente às novas ameaças, tanto no âmbito preventivo, como na coordenação com os demais órgãos da administração federal. Os demais sistemas de segurança, como a Polícia Federal e os órgãos de Segurança Pública cumprem a sua destinação prevista na Constituição.

 E, com suas atribuições definidas, buscam cooperar no combate às ações que se enquadram como novas ameaças. Em fim, o aparato policial do Brasil desempenha um papel importante no combate aos novos desafios que se apresentam para o País.

 Por sua vez, a concepção brasileira sobre Segurança, contida na Política de Defesa Nacional, em sentido mais amplo, abrange o enfoque multidimensional da segurança, entendido como cabível naquele conceito, logicamente que guardada as devidas peculiaridades do País.

 O Brasil será, dentro em breve, palco de grandes eventos esportivos internacionais – Copa do Mundo (2014) e Olimpíadas (2016). Um amplo espectro de medidas de segurança será adotado para estes eventos. Os desafios à segurança serão de natureza diversa e de alcance multidimensional.

 Após essa abordagem do Brasil, retornamos novamente ao ambiente do continente, indicando uma possível estratégia nesse sentido, qual seja: reforçar e assegurar que a segurança multidimensional seja orientada para a cooperação entre os países, no sentido de aglutinar os esforços conjuntos, promovendo a paz, a estabilidade, o respeito e os valores democráticos, conforme assentido na Declaração sobre Segurança nas Américas.

 Os aspectos considerados sobre o caráter multidimensional da segurança, Constantes da Declaração, estão vigentes e não se antevê uma diferença Marcante que possa alterar para um conceito muito distinto. Cabe, pois, incrementar as ações de cooperação para encontrar soluções equilibradas e compatíveis conforme os compromissos e os valores estabelecidos.

 Por fim, após essa breve reflexão, reafirmamos que a segurança multidimensional é um conceito altamente válido para a segurança das Américas, pois somente com espírito de cooperação é possível enfrentar em melhores condições as novas ameaças que nos afligem.

 Fonte: Renan Bolfoni da Cunha – Coronel do Exército

 http://www.coter.eb.mil.br/images/documentos/textos_reflexao/Seguranca_Multidimensional_Bolfoni_Nov_12.pdf